domingo, agosto 31, 2008

Primavera


Havia um tempo em que os homens eram como que crianças na terra, não sabiam o que era o sol, se espantavam com o vento, com a chuva, com as plantas que nasciam do terra, com as enormes árvores dos bosques, com as flores, com as mudanças do tempo que fazia o vento se esfriar, as as folhas da árvores caírem, as plantas secarem, e até o sol diminuir seu calor, tudo que viam era estranho aos seus olhos, nao sabiam o porquê de nada que acontecia junto deles na terra, e estavam sempre espantados com todos os acontecimentos e com todos os seres que povoavam a terra. Mas uma noite, um velho muito sábio teve um sonho, estava diante de uma montanha enorme, cheia de luz, quando uma voz feito trovão ressoou do cume da montanha, fazendo com que o céu inteiro se entrecortasse de raios e relâmpagos, o velho então caiu de joelhos, e colocando a cabeça sobre o chão, começou a ver imagens de todas as coisas que os homens achavam estranhas na terra. Cada imagem lhe revelava como era de verdade e de onde vinha para a terra. Logo que acordou, o velho sentiu medo, mas umas vozes suaves, como vozes alegres de moças, lhe animavam e lhe traziam à memória todo o acontecimento de seu sonho. A partir de então saía pelos lugares cantando em alta voz todas as coisas que as moças invisíveis lhe falavam, e todas as visões de seu sonho eram narradas continuamente a todo o povo. Surgiu a partir de então o sentido para todas coisas do mundo, as pessoas souberam então que habitavam uma terra formada por deuses, os quais revelaram ao velho sábio todos os mistérios que envolviam a terra e tudo que nela acontecia, e para que o velho não esquecesse o sonho, ordenou o deus maior que a voz de suas sete filhas mais sábias, filhas geradas de sua "Memória", estivessem sempre presentes na memória do velho. Assim nasceu a poesia, e esta é que produziu o sentido do mundo para aqule povo, e chamaram o velho sábio de poeta cantor, pois este cantava e lhes revelava todos os mistérios do mundo que habitavam. A partir de então, havia uma história para explicar todas as coisas que aconteciam na terra. O sol era filho do deus mais poderoso, e sabia todas as coisas da terra e dos outros deuses, e as coisas que aconteciam na terra era resultado da vontade de muitos deuses. Diziam que havia uma deusa, chamada Deméter, que significa "mãe da fertilidade", esta era muito boa e dava a vida para as plantas, e as fazia crescer, pedia ao sol que aumentasse seu calor e trazia então a chuva sobre as terra, e tudo sobre a terra reverdecia e nascia e crescia, os homens se alegravam e faziam festas pelas colheitas fartas. Tal deusa tinha uma filha pequena, chamada Perséfone, era esta uma mocinha muito bela e alegre, que vivia a correr pelos jardins e a colher flores, a qual era muito amada por Deméter. Um dia um certo deus, chamado Hades, que era rei de um reino escuro debaixo da terra, que os homens chamavam de reino dos mortos, resolveu abrir a superfície da terra para espionar os homens vivos, e deu de cara com a princesinha Perséfone, sem pensar duas vezes, Hades raptou a bela mocinha, Perséfone, e levou-a para seu reino subterrâneo. Deméter ficou muito triste com o sumiço da filha, pois ninguém sabia contar-lhe o que se passara com ela, apenas alertada por um grito da filha, Deméter ainda correu à sua procura, gritando o seu nome pelos campos. Desesperada, percorreu o mundo inteiro, com uma tocha acesa em cada mão e um fio de lágrimas em cada olhar. Na sua busca encontrou Hécate numa encruzilhada, que ouvira Perséfone gritar mas não vira quem a levara; o sol, porém, que tudo via, revelou a identidade do raptor...Depois de nove dias e nove noites, desiludida e cheia de dor, Deméter envelheceu como se muitos anos se tivessem passado e a felicidade fosse agora um sonho longínquo: a sua beleza desfez-se, a sua alma ressecou-se de desgosto, a pele murchou, o olhar escureceu-se. Tornou-se estéril e a vegetação sob seu domínio respondeu da mesma maneira, tornando a terra infértil e árida, trazendo a fome e a desolação aos homens, que nao mais faziam festas.Parecia que toda a humanidade ia morrer, e até os deuses se viram privados dos sacrifícios e oferendas que estavam habituados a receber dos homens depois da revelação ao velho sábio da terra.Então disse Deméter ao deus mais poderoso entre os deuses: se a minha filha não voltar para mim, a terra permanecerá como a minha própria existência: vazia e seca como um deserto! Perturbada a ordem natural, Zeus teve de intervir junto de Hades, pedindo-lhe que libertasse Perséfone e aplacasse assim a dor daquela mãe. No entanto, Perséfone, perdera já a inocência de menina e a possibilidade de retornar à sua existência anterior. Vivia agora com Hades e já havia se alimentado dos frutos do mundo subterrâneo, o que a ligava para sempre àquele triste lugar.Zeus deliberou e proferiu então a sua sentença: durante nove meses de cada ano, Perséfone viveria com sua mãe, mas nos três restantes devia voltar para Hades e governar enquanto rainha do mundo subterrâneo.Quando Perséfone regressou à superfície e abraçou a mãe, ressurgiu o tempo da abundância. Os dias voltaram a ser feitos de sorrisos, alegrias e luz. Os dias ganhavam às noites. As árvores floriam, davam frutos que amadureciam e os homens colhiam o seu sustento. A terra era fértil e generosa.Mas quando Perséfone desceu novamente às entranhas da terra, as flores murcharam e desapareceram, as árvores perderam as suas folhas, a terra ficou despida, fria, desolada. Ao cantar dos pássaros sucedeu o silêncio. Só o céu zangado massacrava a terra com chuvas e raios. Apática, Deméter enrolava-se triste no seu manto, não deixando sair nada do seu poder divino a favor do Mundo. Assim aconteceu o primeiro Inverno.Todos os anos, nos três meses de ausência de Perséfone, sua mãe e a terra vestiam-se de luto. Mas quando a jovem regressava, as flores começavam a florir sob o chão que ela pisava, as folhas desabrochavam e os pássaros voavam em redor da sua cabeça. Perséfone trazia consigo a Primavera.E só quando terminavam as colheitas e Hades chamava, Perséfone descia ao reino das sombras, deixando atrás de si o Inverno.
Josias Arantes
(Meu mito preferido escrito por um colega da Pós)